O
nosso objetivo é
partilhar a indignação
diante de grave acontecimento decorrente de uma tendência que vem
prevalecendo no sistema estadual de saúde.
O
governo de SP, através
da Secretaria Estadual de Saúde
(SES), assumiu, oficialmente, que serviços de base psicanalítica não contam com eficácia comprovada. Nesse
contexto, propõe
encerrar o apoio financeiro que há mais de dez anos
confere ao Centro de Referência
da Infância
e Adolescência
- CRIA.
O
CRIA foi inaugurado em 2002, por um convênio entre a UNIFESP e a
SES, com a interveniência
da SPDM. É
uma instituição
que realiza cerca de 1200 atendimentos mensais de bebês, crianças, adolescentes e seus
familiares através
de uma equipe interdisciplinar que garante uma visão e assistência global aos
pacientes.
A
assistência
prestada pelo CRIA é
abrangente e inclui pacientes com diversas patologias graves. Para nosso
espanto, a diretriz atual da secretaria de saúde do Estado de São Paulo criticou
severamente o fato de atendermos qualquer queixa ou diagnostico afirmando que a
população
alvo deve ser composta por pacientes psicóticos e autistas. Entendemos
que todo sofrimento merece ser escutado e tratado sem delimitar sua atuação em função de uma única patologia,
diferentemente do que prega o mainstream
atual das práticas
médicas
e assistências
vigentes em nossa atualidade.
Nossos
encaminhamentos são
oriundos de diversas instituições
(abrigos, escolas, creches, conselhos tutelares, vara da infância, hospitais, caps e
outros serviços
de saúde
mental) que sideradas e apavoradas diante daquilo que escapa a nomenclatura dos
manuais classificatórios
nos procuram e demandam atendimento a esta população, pedindo ainda, em
muitas situações,
supervisão
para a própria
equipe.
Em
que espaços
serão
escutadas e trabalhadas nas suas questões, as crianças que estão vivendo um luto pela
morte de algum parente próximo,
os adolescentes adotados, devolvidos por seus pais para abrigos? Ou mesmo
adolescentes em relação
fusional com seus objetos primordiais que fazem em seu próprio corpo os cortes
simbólicos
que não
estão
operando em seu psiquismo, levando-os a sérias tentativas de suicídio? Sem falar ainda nas
inúmeras
crianças
que estão
com fobias que a impedem de ir à
escola, estudar ou aprender? Ou ainda os adolescentes chamados delinquentes que
buscam a qualquer preço
uma referência?
E as crianças
vitimas de violência,
que necessitam de um espaço
para falar?
Desta
forma, ainda que atendemos, ao longo destes dez anos, crianças autistas e
adolescentes psicóticos
(temos dois programas estruturados para isso além de um programa de
atendimento de bebês
que procura identificar sinais de risco para tais patologias e intervir
precocemente) não
restringimos assistência
à
estas patologias.
A
razão
de nossa posição
se deve à
nossa concepção
de clínica
que considera como aspecto fundamental a plasticidade dos sintomas apresentados
na infância
e adolescência,
e além
disso, o fato do sofrimento destes jovens
estarem referidos a dinâmica
familiar a qual estão
inseridos. Se isto, por um lado, torna a tarefa clinica muito mais complicada e
desafiadora, por outro, também
garante as intervenções
um grande poder de êxito,
tornando esta clinica muito menos sujeita a cronificacão das patologias e por
isso muito mais flexível
e surpreendente.
Muitos
pacientes que foram atendidos no CRIA melhoraram de seus sintomas e puderam
retomar sua vida e seu desenvolvimento.
Mas não
nos dispomos e nem nunca tivemos a pretensão de isentar os nossos
pacientes de fazer calar sua angustia. Os convidamos com disponibilidade a que
eles falem e escutem a história
que acompanha seu sofrimento, o que se coloca nas entrelinhas, as várias versões sobre o que se
apresenta como sintoma.
O
fechamento do CRIA representa também uma perda na formação de médicos residentes,
fonoaudiólogos,
terapeutas ocupacionais, enfermeiros, psicólogos e assistentes
sociais que la realizam suas primeiras experiências clinicas com crianças e adolescentes e que
aprendem que por detrás
de um diagnóstico,
de uma patologia, existe um ser humano que sofre.
O
CRIA, por estar inserido numa Universidade, oferece muitas horas de trabalho de
sua equipe na formação de estudantes e outros
profissionais da rede por meio de supervisões clínicas, aulas, palestras,
seminários
e simpósios.
Infelizmente, a SES ignora tais atividades afirmando que a instituição produz pouco.
A produtividade de um serviço que prima
pela qualidade não pode ser medida apenas levando em conta números de
atendimentos. O CRIA oferece aos pacientes consultas de longa duração para que
possam falar de suas questões que ultrapassam a descrição fenomenológica dos
sintomas.
A
SES, ao fechar o CRIA, leva em consideração as consequências para os pacientes
que há
anos lá se
tratam? Como responderão
adolescentes que já
tentaram suicídio
diversas vezes e que lá
encontraram um espaço
para falar de seus sofrimentos sem precisarem recorrer a uma forma tão dramática? E as crianças tão vinculadas aos
profissionais que há
anos as atendem?
Nos
resta agora a lamentável
tarefa de dizer aos pacientes e seus familiares que há mais restrições de assistência a eles no quadro da nossa saúde pública. Dizer a eles que
o sofrimento que os levou a buscar atendimento não é suficiente nem legitimo
de merecer escuta e trabalho. E que o vínculo que fizeram com os
profissionais é
irrelevante. Ainda que do ponto de vista epidemiológico seus sintomas e
queixas componham parte significativa da demanda de atendimento.
Um comentário:
Ontem fui ao CRIA e recebi essa triste noticia... e estou muito decepcionada com o governo que mai uma vez demonstra nao estarem nem ai para a saude e o pior por picuinhas politicas eles fecham as portas de um lugar referencia, onde de certa forma é um porto seguro é um pedaço do chao que nos foram tirados com o diagnostico do autismo... e agora??? perdemos novamente o chao... o meu filho melhorou consideravelmente depois do CRIA apesar de ter so um transtorno do desenvolvimento e nao o diagnostico autistico. mas hoje ele fala melhor, brinca melhor, e se relaciona muito melhor.. è um descaso tao grande do governo de Sao Paulo que eles se quer cnhecem o trabalho do CRIA e decide despedir profissionais qualificados, desintegrar mais de 250 crianças que o CRIA vem tratando cm carinho e muito respeito e simplesmente fechar as portas... Esses caras do poder nao pensa em ninguem, nao pensa que por tras dessas crianças tem uma historia, um sofrimento e um poder enorme de levar a essas crianças o poder de um dia poderem caminhar sozinha.... MUITO TRISTE!!!!
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